AGENDA CULTURAL

2.10.10

Educador pela pedra - José Fulaneti de Nadai

Biografia
José Fulaneti de Nadai, 31/12/1939, Alto Alegre, filho de Santo Fulaneti e de Ana de Nadai. Casado com Vânia Maria Guitti, filhos: Alba Regina, João Francisco e Oriana. Professor de Português da rede estadual de 1969-1986. Professor universitário de projeção nacional, sempre convidado a dar palestras pelo Brasil. Trabalhou no rádio entre 1958-68. Graduado pela Unesp de Assis, mestrado e doutorado pela USP. Professor da Fundação Educacional de Penápolis (Funepe) de 1969 a 2005. Lecionou no curso de Jornalismo da Unesp de Bauru.Vereador em Penápolis, de 1983-88. Diretor Regional da Cultura em Araçatuba, governo Montoro.

Crônica
Hélio Consolaro*

Este croniqueiro queria vencer na vida e escolheu os estudos como ferramenta. Eu era um jovem estudante do curso noturno em Araçatuba, com deficiência na formação, mas com gana de superar dificuldades e enfrentar desafios. Nem sabia que “vencer na vida” tinha vários significados. Hoje tenho convicção de que “ser” é mais importante que “ter”.

Assim, pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Instituição Toledo de Araçatuba não oferecer cursos à noite em 1969, fui estudar em Penápolis. De repente, na primeira semana de aula, pinta na frente da sala de aula um sujeito franzino, falando difícil e dizendo que era professor de Teoria da Literatura. O garoto Consa não entendia nada, o “home” falava grego. Aquilo foi um desafio. Senti um amargor na boca: não me ensinaram nada! Onze anos de escola, pobre de corpo e alma. Vencer na vida não estava fácil.

Esse professor que falava complicado era o José Fulaneti de Nadai. Nas férias de julhode 1969, numa visita a Penápolis durante o dia, fui até a casa do “Fula” (assim era chamado pelos alunos), no maior acanhamento, pedir alguns livros emprestados para o mestre, eu precisava de recuperação. Ele me atendeu com entusiasmo, voltei com mãos cheias de livros. A partir daí, se eu não ler alguns livros nas férias, parece que elas não existiram.

Em 1970, minh’alma estava em ebulição, porque ele (e outros professores) não se limitava a ensinar, queria passar a seus alunos uma visão de mundo, para que cada um fosse protagonista de sua própria vida.

Numa recente entrevista à Folha da Região (24/5/2009), se reportando à perseguição política promovida pela ditadura militar da qual também foi vítima, ele declarou: "Eu sempre busquei conscientizar meus alunos, meus amigos docentes e outras lideranças com o uso da palavra".

A maior vitória daquela turminha que curtia o Fula, ia discutir literatura e política em torno de uma mesa de bar (foi com ele que aprendi a tomar Campari), foi descobrir que era tímido e era preciso agir para arrumar-lhe uma namorada, e com a Vânia ele está casado até hoje.

Fulaneti é o ícone de um professor que, além de cumprir bem seu magistério, soube usar a sua cátedra para mudar a vida de seus alunos. Naqueles anos de chumbo, promover o protagonismo era chamado de “proselitismo político”. Hoje, com cabeças mais arejadas, tem o nome de “construção da cidadania”.

Na sua coluna poetagem, Tito Damazo, que fazia parte de minha classe e também sobremaneira teve influência de Fulaneti até nos tiques nervosos, escreveu em sua coluna Poetagem: “... em Penápolis, reside um dos melhores intérpretes e estudiosos da poesia de João Cabral. Trata-se do prof. Dr. José Fulaneti de Nadai, cujo mestrado: O deus da sede: uma análise de paisagens com figuras de João Cabral de Mel Neto, USP, 1978 e doutorado A voz alta de João Cabral, USP, 1994, são tidos como dois dentre alguns excelentes estudos feitos em torno da obra de João Cabral”. Possui livro publicado a respeito pela Abril Cultural.

Fulaneti fez muitos jovens descobrirem que no meio do caminho tem uma pedra, mas ela pode ser uma boa mestra.


 Hélio Consolaro, professor, escritor e jornalista. Membro da Academia Araçatubense de Letras. Atualmente é secretário da Cultura do município.

Obituário do jornal Folha de São Paulo, 21/06/2013

José Fulaneti de Nadai (1939-2013)

Um professor doutor em literatura
 
ESTÊVÃO BERTONI, DE SÃO PAULO
Por causa da infância na zona rural de Alto Alegre (SP), José Fulaneti de Nadai manteria o gosto por sítios. Nos últimos anos, o doutor em literatura cuidou da propriedade que comprara em Goiás.
Fula, como o chamavam, era filho de pequenos sitiantes que cultivavam café. Por volta dos 12 anos, foi viver em Penápolis (SP), onde começou a trabalhar como locutor de rádio. Até que decidiu cursar letras na Unesp de Assis.
Quando estudante, presidiu o diretório acadêmico da faculdade e, por se opor à ditadura, foi preso três vezes.
Fez mestrado e doutorado na USP, em São Paulo. As duas teses eram sobre seu escritor favorito: o poeta pernambucano João Cabral de Melo Neto. Como professor, lecionou teoria literária na Funepe (Fundação Educacional de Penápolis), que chegou a dirigir, e deu aulas no curso de jornalismo da Unesp de Bauru.
Foi ainda diretor regional de Cultura em Araçatuba. Em 1982, pelo PMDB, elegeu-se vereador, o mais votado de Penápolis (que hoje tem 58.510 habitantes), com 737 votos.
Marxista, manteve-se fiel a sua ideologia até o fim da vida, como conta a mulher, Vânia, professora de matemática aposentada. Apoiou Fernando Henrique Cardoso ao Senado, mas depois se desiludiu com o político, sentimento que se repetiria com Lula.
Escrevia uma coluna semanal num jornal local, em que analisava fatos políticos ou narrava causos de um personagem (caboclo) que criara.
Fumou por 54 anos. Teve um enfisema e um câncer. Sua saúde se agravara por causa de uma pneumonia. Morreu no sábado (15), aos 73. Deixa três filhos e três netos.

2 comentários:

Anônimo disse...

Ao senhor José Fulaneti de Nadai, bom saber que você existe ou melhor que existe pesssoa igual a você,assim, pessoa maravilhosa assim.
Um grande abraço.
Lourival de Nadai
Marechal Floriano ES

Anônimo disse...

Sr. Hélio
Conheço o Dr. Fulaneti, não o vejo desde 1967. Moramos na pensão do Sr. Carlo Frasinetti em Assis, tenho uma foto dele em seu refúgio de estudos. Tentei achá-lo na lista telefônica, mas nada. Caso queira me ajudar a encontrá-lo ( eliseubuzzo@uol.com.br), um abraço e parabéns pelo seu Blog. Eliseu