AGENDA CULTURAL

21.6.11

Corpo bailarino


Hélio Consolaro*

O bailarino é feito de retalhos dos deuses, / lançados pela Terra,/ para que não possam ser esquecidos em sua divindade.../ O bailarino tem um pouco de ave / e de borboleta/ ou libélula,/ ou pluma, / ou floco de algodão,/ ou pétala,/ ou poalha,/ a dançar na luz...
Clevane Pessoa de Araújo

Dançar é terapêutico. Assim afirma Dona Ignez. Sexagenária, sozinha, cujas companhias são amigos de trabalho e as pombas que assentam em sua mesa na recepção da Casa Cultura “Adelino Brandão”. Elas fazem parte de suas relações afetivas. Depois das frustrações com o humano, optou por animais.  

Decidiu não se abater pelas frustrações amorosas, vive contando piadas, cantando no coral. E não gosta de velho, se possível, bem mais novo. Se a transgressão tiver que ocorrer, que seja fogosa.
Chego na segunda-feira, perguntando:

- Como foi o baile no clube da terceira idade, Dona Ignez?

- Animadíssimo, Seu Hélio! Dancei todas...

- Então, a senhora é uma dama disputadíssima!

- Que nada! Eu é que tiro os homens para dançar. Homem é bola murcha. Muitos perderam o traquejo da juventude.

Minha mãe, octogenária, gosta de contar nas conversas familiares dos bailes frequentados por ela na juventude, com sanfoneiro, barraca, na zona rural.

A dança era uma espécie de revoada de jovens à busca do acasalamento. Como o é até hoje.

- Bepo, você está dançando com uma espiga de “mio”  no bolso!
Ao se casar, a festança acabava. Havia a seriedade, penca de filhos. E quem não se casasse era carimbado como solteirão ou solteirona. Mulher encalhada em casa era um desgosto para os pais. Isso aos 20 anos de idade. Casar com mocinha de 13 ou 14 anos era normal. Roubar a moça dos pais, comum. A pedofilia era institucionalizada.     
Cia. Faces Ocultas com o espetáculo Folclorando
Por mais que alguns neguem, a dança está ligada ao erótico. Dançar com a irmã é como tomar cerveja sem álcool. Quem visitar as casas noturnas de sua cidade, como: forró, vanerão, etc. vai descobrir quantas mulheres separadas ou viúvas existem, enfim, desmaridadas. Estão lá no pesque-pague da pista de dança à procura de um companheiro, nem que seja apenas para aquela noite.

Apesar de toda essa utilidade da dança, como são as palavras numa notícia de jornal; há a gratuidade da dança, que é arte, como as palavras num poema de Mário Quintana. Em qualquer dança, o corpo fala, mas no palco, ele fala mais alto e com requinte. “Dançar é escrever com o corpo”, escreveu a poetisa.
Cia. Faces Cultas - Salto-SP - espetáculo "Rubras Faces" - 3.º Dança Araçatuba - junho 2011
No último fim de semana, tivemos um festival de academias de dança em Araçatuba, promovido pela prefeitura. Além delas, se apresentaram o Balé Municipal, os alunos do Curso de Artes Cênicas da Universidade Estadual de Londrina-PR e Faces Ocultas Companhia de Dança, de Salto-SP. Araçatuba dançou de alegria pelos pés das bailarinas.  
Vanessa Manarelli - coordenadora do Balé Municipal - Araçatuba
ORGANIZADORA DO "DANÇA ARAÇATUBA"
 Muitos pais, avós, irmãos foram ver a prole dançar (filha, irmã, neta), já que ainda há um preconceito em ter algum bailarino na família, mas uma boa parcela estava lá para ver arte, saborear as evoluções, ver o corpo falar. A gente que organiza o encontro fica embevecido, orgulhoso.
Curso de Artes Cênicas da UEL

*Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Membro da Academia Araçatubense de Letras, da União Brasileira de Escritores e da Cia. dos Blogueiros. Atualmente é secretário municipal de Cultura de Araçatuba-SP . E-mail: conselio@gmail.com

Plateia no Espaço Cultural Thathi-Coc, onde foi realizado o 3.º Dança Araçatuba

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